Os problemas de saúde mental e de relações, incluindo o assédio moral e o suicídio, são cada vez mais frequentemente noticiados na realidade de diversas universidades brasileiras. Assim sendo é urgente o desenvolvimento de ações institucionais que transcendam iniciativas de atores individuais em esforços pontuais e temporários. Somos gratos a todos que até aqui usaram seu espaço possível de ação neste sentido. Mas precisamos continuar e ir além.

O programa UFPR ConVIDA se apresenta como uma resposta institucional de transformação da realidade a partir de ações planejadas e intencionais voltada às pessoas e às relações, visando prevenir problemas graves de relações e de saúde mental, incluindo o assédio moral e o suicídio na comunidade UFPR. Compreende-se que estas problemáticas têm sua origem na articulação de aspectos individuais, do trabalho e sociais mais amplos. Esta análise é importante para que se entenda das intervenções aqui propostas.

Na contemporaneidade há um enfraquecimento de referenciais identitários ligado às instituições (família, coletivos e transcendência) e um enfraquecimento no tecido social, nos vínculos sociais estruturantes. Como afirmam, Charles Taylor e Theodore Dalrymple, vive-se no auge da autenticidade do sujeito, pautada no sentimentalismo tóxico colocando a expressão individual como ilusoriamente suficientes para atribuir um sentido existencial. Paradoxalmente esta autonomia individual vem acompanhada da baixa tolerância à frustração e da necessidade aumentada de reconhecimento do outro. Ao mesmo tempo há obstáculos para que esta demanda de reconhecimento seja respondida, devido à fragilidade do tecido social, implicando numa vivência intensificada de vazio existencial e no aumento de vulnerabilidades emocionais e de dificuldades relacionais.

Por sua vez, há uma expectativa inflada de retornos efetivos advindos da carreira para além do que ela pode oferecer. Na realidade de instituições de ensino estes contornos aparecem em projeções ilusórias de alunos e de profissionais (técnicos, professores, terceiros) em relação a reconhecimentos sem correspondentes reais sobre sua trajetória profissional e acadêmica dentro da universidade. Somando-se a isso, a complexa realidade das organizações públicas se impõe como um desafio aumentado, tanto pela forma de organizar suas atividades internamente assim como nas interferências políticas mais amplas, sendo muitas vezes mais um obstáculo na realização das expectativas individuais.

Desta maneira verificam-se acentuadas as frustrações e alargadas as vulnerabilidades para problemas de ordem emocional e para as dificuldades nas relações interpessoais. O ambiente das universidades é propício para que a crise de sentido se evidencie tanto na vivência de alunos como de profissionais, podendo aparecer na forma de violência contra si mesmo (ideação suicida) e de violência contra o outro (assédio moral).

O problema é complexo e exige soluções ousadas. Exatamente por ser um local na qual as pessoas depositam expectativas aumentadas é também aqui que as ações podem ser mais efetivas!

Pouco a universidade pode fazer para interferir em aspectos individuais ou sociais mais amplos que têm suas implicações nas relações humanas e na saúde emocional. Entretanto, muito nos cabe como universidade na constituição de ambientes e tarefas mais favoráveis às relações e à saúde emocional, com potencial de prevenção do suicídio e do assédio moral.

O Programa UFPR Convida conclama a VIDA como elemento estruturante de suas ações, a qual é superior a nossa própria existência humana e que evidencia nossos limites naturais, nos lembrando que somos acima de tudo seres humanos falíveis buscando o olhar um do outro! Somos todos a UFPR e o que ela será depende também das nossas escolhas no que toca à saúde das pessoas e das relações aqui estabelecidas. É tempo das multiplicidades serem fontes de construção de pontes que nos aproximam e não de muros que nos separam.

Este programa pauta-se no princípio do trabalho em rede e na gestão por cooperação, por meio de grupos integrados de atuação. Sendo assim a UFPR ConVIDA, instiga e oportuniza a cada um dos seus integrantes, alunos e profissionais, a cooperarem em suas escolhas individuais e em esforços conjuntos para que as relações e as tarefas na UFPR aconteçam de maneira cada vez mais profissional e humana. Cuidando com as armadilhas de falsas esperanças, é observando e valorizando o que há de vida, de bom e de belo em meio aos obstáculos do cotidiano que é possível a oportunidade do encontro e da valorização humana na nossa realidade. E como temos VIDA aqui! É tempo de colocá-la no centro do palco.

E nesta trajetória Carlos Drummond de Andrade nos inspira quando afirma: “A cada dia que vivo mais me convenço que o desperdício da VIDA está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca e que esquivando-se do sofrimento perdemos também a felicidade”.

Que tenhamos todos ousadia para ocupar nosso espaço de ação em escolhas cotidianas que mobilizem, não a morte e a doença, mas a saúde e a vida para aqueles seres humanos que têm sua existência marcada por esta universidade.

Profª Lis Soboll.